Relatando a descoberta uma Nova Cratera Fantasma

Qudrante 4

Sempre tive o maior interesse na observação, principalmente na astrofotografia de formações Lunares e desde o início utilizando principalmente o Virtual Moon Atlas procurei localizar e conhecer as características mais marcantes das regiões que eu observava ou fotografava.

Com o passar do tempo fui adquirindo um melhor conhecimento e reconhecendo com maior facilidade estas regiões e seus principais acidentes o que facilitava muito a percepção de qualquer coisa que destoasse da paisagem tradicionalmente observada.

Assim no dia 5 de janeiro de 2012, fotografando a região próxima ao Plateau Aristarchus, percebi uma estranha depressão que me chamou a atenção.  Procurei situá-la em mapas lunares e mesmo no Virtual Moon Atlas, mas vi que nada constava.

Pesquisei na internet, pedi ajuda de colegas no Brasil e no exterior para esclarecer o que poderia ser esta formação, acreditava que ela já deveria ser conhecida ou que outros já houvessem observado a mesma.

Em princípio não consegui encontrar nenhuma referência sobre esta formação lunar.

Olhando as fotos abaixo, registradas com um intervalo de 2 horas, a impressão que temos é a existência de uma depressão só revelada quando o Sol se encontra em um angulo muito baixo de iluminação.

Foto 1

Foto 2

Fotos feitas em técnica afocal, exposição única, utilizando uma câmera compacta (Fuji) e um telescópio GSO dobsoniano de 300mm.

Enviei as fotos ao amigo Vaz Tolentino do Observatório Lunar (VTOL) e ele forneceu-me a seguinte explicação:
Realmente, a sua foto, devido ao ângulo da luz solar, captou uma
interessante e incomum depressão circular, que tem junto à sua borda
sudoeste, a cratera WOLLASTON D (5km de diâmetro).
A formação é muito estranha por não parecer com o estilo das crateras
fantasmas conhecidas.
O estranho e não comum é que, parece que a suposta cratera foi
inundada por lava basáltica e, ao invés de ficar cheia e nivelar com o
piso exterior circundante, encheu apenas um pouco e não nivelou,
ficando como uma "cuia" ou "tigela", além de não deixar resquícios de
um pico central. Esta depressão aparenta ter uns 42 Km de diâmetro,
sendo um pouco maior que ARISTARCHUS.
Verifiquei imagens do LRO e, infelizmente, não dá para para
identificar nada, devido à luz do Sol estar alta nas fotos.
Precisamos de mais fotos dessa região, em condições de luminosidade semelhante à existente nesta foto.

Assim, o tempo foi passando, mas eu não esqueci a depressão que tanto me intrigava e desta forma no dia 01 de junho de 2012 obtive novas fotos que novamente acusavam a estranha depressão.

 Foto 3

 Foto em afocal, exposição única (GSO 12” dobs + câmera Fuji compacta)

 Desta vez ao invés de enviar as fotos ao LPOD como da primeira vez, resolvi pedir ajuda a colegas brasileiros como Vaz Tolentino e Alexandre Amorim. Por sugestão do Amorim resolvi contatar a BAA (http://www.baalunarsection.org.uk/) Seção Lunar onde fiz contato com o Dr. Anthony Cook. Enviei ao mesmo as fotos obtidas por mim em janeiro e em junho bem como a desconfiança de que a referida depressão ainda não havia sido catalogada.
Após a troca de vários e-mails recebi do Dr. Cook a seguinte mensagem que eu transfiro na integra:

                On Seg 4/06/12 07:06 , "Tony Cook [atc]" atc@aber.ac.uk sent:
Dear Avani,

Thank you for your images. It looks like a buried ghost crater that you have found. Please keep on looking
for other ghost craters elsewhere on the Moon because I think that there may be quite a few that
are visible near to sun rise or sunset that remain to be discovered. I think that this work will
be of great interst to Peter Grego.

Also I like the quality of your images.If you would like to take images on the dates and times
that are listed in:

http://users.aber.ac.uk/atc/tlp/tlp.htm

...and find Brazil, then this could be very useful for my own research in disproving
some TLP observations from the past.

Many thanks

Tony

----------------------
Dr Anthony Cook
Institute of Mathematics and Physics,
Aberystwyth University,
Penglais, Aberystwyth,
Ceredigion. SY23 3BZ.
United Kingdom

 

E o trabalho ficou nisto, mas não caiu no esquecimento!

No mês passado utilizando a nova câmera QHY 5L, uma CMOs colorida dedicada para fotografia Lunar e planetária de alta resolução, obtive uma foto mais detalhada do local onde se situava a referida depressão:

  Foto 4

 Foto feita em projeção negativa (GSO 12” em equatorial Darío Pires + câmera QHY 5L)

 Isto permitiu que o colega Vaz Tolentino traçasse o perfil altimétrico da depressão e fizesse a seguinte análise:

 

                Caros Avani e Amorim:

 

Fiz a análise altimétrica da cratera fantasma. Verifiquei tratar-se de uma depressão com cerca de 46 km de diâmetro e apenas 130 m de profundidade. 

Veja no arquivo anexo o perfil altimétrico da cratera fantasma.

 Foto 5

 

Logo depois recebi novo comunicado do amigo Vaz Tolentino comentando o seguinte:

 Caros Soares e Amorim:

Analisando as fotos do Avani (do passado e do presente), juntamente com o perfil altimétrico que apresenta uma depressão clássica de cratera fantasma, chego à conclusão que, muito provavelmente, trata-se da descoberta de uma nova cratera fantasma sem catalogação.

Analisando também, a altimetria das crateras fantasmas DAGUERRE, LAMONT e aquela descoberta pelo VTOL em fevereiro de 2011 (vide arquivos anexos), chegamos à conclusão que elas possuem perfis altimétricos bastantes semelhantes, sendo que, a cratera fantasma do Avani, é um pouco mais rasa (130 m de profundidade) do que DAGUERRE e LAMONT (ambas com aproximadamente 400m de profundidade). 

Porém, a profundidade da cratera fantasma do Avani (130m) é mais compatível com a cratera fantasma descoberta pelo VTOL (que tem aproximadamente 100 m de profundidade). O que isto significa? Significa que, no passado (na época dos antigos selenógrafos), quando o interesse principal em observar a Lua era realizar o mapeamento de seu relevo, identificando e nominando suas formações, eles não tinham a tecnologia atual, ou seja, formações rasas como essas duas crateras fantasmas (Avani e VTOL) são muito difíceis de observar através de uma ocular, para se ter convicção do que realmente se está observando. 

Depois do período inicial de catalogação e nominação das formações do relevo, desenhos de mapas lunares e outros estudos, chegou-se à era espacial. As primeiras sondas lunares robóticas (soviéticas e americanas) e as alunissagens tripuladas das missões APOLLO, tinham outros objetivos científicos que não eram descobrir novas formações não catalogadas. Além disso, mesmo nas fotos de altíssima resolução executadas pelas modernas sondas lunares robóticas (SELENE, LRO, GRAIL, etc), as imagens foram capturadas, em sua maioria, com a luz solar vindo do alto e não de forma oblíqua, o que dificulta o realce do relevo e não facilita a identificação de formações mais rasas como essas crateras fantasmas.

Para os selenógrafos modernos, somente após a evolução tecnológica das câmeras fotográficas digitais (CCD e CMOS), juntamente também, com a evolução da ótica dos telescópios (grandes e bons espelhos e também as lentes APO), combinada com o angulo favorável de incidência de luz na superfície lunar, ficou mais fácil identificar novas formações menores, "camufladas" e não catalogadas na Lua. Digo isso, também, baseado na notícia divulgada em http://www.oserrano.com.br/print.asp?tipo=Astronomia&id=3295 , afirmando que, somente em 20 de setembro de 1996, foi fotografado pela primeira vez no Brasil, por nosso amigo Nelson Travnik, a pequena cratera Santos-Dumont (8 Km de diâmetro e 2 Km de profundidade). Note bem, a cratera Santos-Dumont foi nominada pela IAU em 1973 (originalmente chamava-se Hadley B) e, somente em 1996, alguém no Brasil conseguiu fotografá-la. Vejam só! Isso só aconteceu há poucos anos atrás! Hoje em dia, fotografar Santos-Dumont é muitíssimo fácil. 

 Parabéns Avani Soares por sua descoberta!

 Mais um ponto marcado pela nova geração de selenógrafos brasileiros. Um abraço da equipe do VTOL!


 

 

Deste modo creio, que está descartado qualquer engano quanto a existência e identificação da referida formação, faltando apenas a divulgação e o reconhecimento oficial para coroarem o referido trabalho.

Ainda pretendo obter fotos em melhor ângulo de iluminação e resolução do referido local, pois as últimas fotos feitas com a QHY 5L deixaram a desejar devido ás más condições de alta turbulência atmosférica no dia do registro.

 

Agradecimentos:

Quero deixar meu agradecimento aos amigos Vaz Tolentino do VTOL e Alexandre Amorim que tanto contribuíram para que este trabalho tivesse êxito.

Quero agradecer também ao meu mentor Ilídio Afonso, que está sempre apoiando e incentivando a dar o melhor de mim, e sem o qual eu “Seria apenas mais um astrofotógrafo satisfeito por ter conseguido registrar mal e parcamente uma meia dúzia de crateras!

Avani Soares

Observatório Parsec – Canoas/RS